segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Rascunho de fábula


Manoela caminha majestosamente em direção à parada de ônibus. Não costuma dar bom dia a ninguém, e sempre levanta o nariz. Simpatia é sinônimo de fraqueza, de vulnerabilidade.
Um anão negro lhe chama a atenção. Ele anda com uma bengala e usa óculos escuros. Cego, ela pensou. E era mesmo. Negro, anão, cego... e ainda anda de ônibus! Pobre coitado.
Jackson caminha malandramente em direção à parada de ônibus. Não costuma dar bom dia a ninguém, e sempre faz questão de forçar os músculos do braço. Braço forte é sinônimo de poder, de caráter.
Um anão negro lhe chama a atenção. Cego, ele pensou. E era mesmo. Negro, anão, cego... só resta ser homossexual! Pobre coitado.
Sabrina caminha decididamente até a parada. Tem o andar simples. Dá bom dia a todos e oferece chocolate para as três pessoas.
Manoela sorri com meio rosto e faz cara de desprezo em seguida.
Jackson mostra o braço.
O anão, por sua vez, aceita. Prova do chocolate e dá um sorriso sincero:
- Adoro Kopenhagen.
Sabrina consente com a cabeça. O motorista do anão, dirigindo um Chrysler, chega e pára em frente à parada.
- Quer carona, moça do chocolate?
- É Sabrina.
- Claro. – olha-a de cima a baixo - Mora aonde?
- Lago Sul...
- Eu também.
Os dois entram no automóvel, rindo e conversando.
Jackson se vira para Manoela:
- O ônibus pra Ceilândia já passou?
- Não vi.
- Aceita um batom?
- Quê?
- Batom... Chocolate.
Vida infeliz. Preconceituosa, pensa Manoela. Rejeita o chocolate com asco, e isso não mudará seus valores.


Moral da história: Pessoas simpáticas podem carregar coisas boas.
Moral da história 2: Pessoas aparentemente inferiores podem lhe oferecer uma grande carona.
Moral da história 3: Preconceito é coisa de gente pobre. Não economicamente.
Moral das entrelinhas: Não importa a marca do chocolate, carona é carona.